ECOS (OU EQUUS) DO CARNAVAL*
por Aldir Blanc
O GLOBO 23/03/2011
Conversei com um amigo a quem respeito profundamente: quem escreve uma coluna e esconde a cara, não a merece. Quero declarar meu desprezo pelo júri de capachos controlado pela LIESA. Diante do visto, a próxima vencedora será de novo a Beija flor, com o enredo "OS SERTANEJOS - A REVOLUÇÃO NA MPB". E para que a agremiação de Nilópolis conquiste o tri, teremos "BRASIL COM B MAIÚSCULO: BBB É CULTURA". O Brasil perdeu. Tenho direito a meu palpite sobre o assunto. Roberto Carlos, como artista, pode cantar no Maracanã e fazer especial de fim de ano, mas não chega aos chinelos de Nelson Cavaquinho. Aquele surdo (não confundir com o nobre instrumento) que deu 9 para a bateria da Mangueira, sabendo que essa note definiria o resultado, só entende da paradinha do bonde. Bem feito para os que julgaram viável viver em cima do muro. Acaba saindo mais cedo da Apoteose. Pouco mais a dizer sobre o trêfego tríduo: destaco o incrível espetáculo do Bola preta (que ninguém cobriu como merecia), a classe insuperável de Luiza Brunet, meu desvairado carinho pelo Simpatia, o Festival de Burrinhas de Mello de Menezes, o eterno Nelson Cavaquinho da Mangueira, com sua espetacular paradona na bateria imortal do Rio de Janeiro. Do outro lado da balança, com cheirinho de putsch na cervejaria, um carnavalesco declarou para a posteridade que a festa "é pláastica. Não há mais lugar para obesos". Ora, ora. E eu que, não tendo experiência em coisas populares, julguei todos estes anos que era o contrário: a folia era dos desdentados, dos miseráveis, dos espoliados e, por que não, dosdeficientes físicos (como eu), dos magrelos e dos obesos, sim! Nesse ritmo, o que o futuro nos reservará? Os obesos deverão ser colocados num spa baiano, tipo Ilê Dachau, onde serão eletrocutados por um trio? Carece de fundamento que o tal carnavalesco pretenda colocar em seu livro sobre a guerra no samba o título "Minha Luta"... Como os três mosqueteiros eram quatro, o tríduo também tem cinco dias, o sábado, o domingo e a segunda engolidos pelos desfiles faraônicos, a terça (ex-gorda, já que não cabem obesos) e as peguetes ensandecidas das madrugadas de quarta (bota cinza nisso). Esses três dias que são cinco, geram a síndrome dos cindo rs: ressaca, remorso, repulsa e rasuras de reciclagem. Ano após ano, partes se manterão nas zonas de sombra e versões mudarão, tentando dourar o erro, o que não tem conserto, nem nunca terá, o momento em que as mandíbulas da besta trituraram a lei do coração. Citei Chico Buarque, porque é dele a melhor definição do carnaval, em uma só palavra: desengano...
*pois é, em meio à tanta bobagem publicada pelo O PANFLETÃO da família Marinho, a gente consegue pescar uma ou outra coisa que valha à pena ser lida e compartilhada. Como este artigo do Mestre Aldir Blanc.