sábado, 30 de junho de 2012

TRÊS POEMAS




MELANCOLIA





O Nordeste nublado
e a saudade do teu rosto,
céu a sangue pisado
e a vontade do teu corpo.

Corredores não são meus,
só pastilhas de hortelã;
meus doces santos ateus
não acordam nessas manhãs.
                  
Minh’alma, de tão cansada,
fere o corpo, esfria o Sol,
canta em fria madrugada,
a saudade em mi bemol.

O dia se abre em ocre,
o vento não cabe mais,
o camelo é triste e sofre
a falta que a casa faz.






A PALAVRA TINTA





Jamais me amarro
à palavra corda.
A palavra, quando corda,
não arrebenta no ante-verso
do poema escrito.
                            
Mas se antítese,
barbante frágil,
a palavra não resiste
aos sobressaltos
do poema áspero.

No céu das palavras,
a palavra linha, a palavra pipa;
e um cerol mal escrito
e cheio de si,
a conspurcar-lhe as cores.

Só a palavra forte,
feita de vento e sol,
sobrevive à brutalidade dos desejos
e ao silêncio
exasperante da morte.

A palavra só é matéria
quando tinta.







NO RECANTO MAIS ESCURO





No recanto mais escuro
do que se chama prazer,
mergulhar de rosto e alma.

E lamber tudo,
até o botão mais saliente;
e deixar o corpo fremer
em prazerosa concussão.

Escrever no retrato
da mulher amada,
as mais deliciosas sacanagens.

E amá-la! E amá-la! E amá-la!
É o que manda a lei.
E jamais desobedecer
às leis libidinosas dos sentidos.
     
Fode-la com força!
Sem pudor e sem recato,
que montanhas, e florestas,
e vales despudorados,
não se fode com recato.

No recanto mais escuro
do que se chama mulher amada,
sorver o néctar, derramar o leite.



todos do livro O VADIO DE CASACA,
no prelo